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Raio-X do Calcanhar de Aquiles da Transação Tributária

Todo sistema sofisticado tem seus pontos vulneráveis — e, na transação tributária, essas fragilidades também aparecem sob a superfície dos números positivos. Apesar dos avanços inegáveis na racionalidade e no impacto social, alguns aspectos ainda representam o “calcanhar de Aquiles” desse mecanismo, revelando desafios que precisam de enfrentamento para que a solução não se torne parte de novos problemas.

Uma dessas fragilidades está no sigilo e na falta de transparência dos critérios usados para calcular o Potencial Razoável de Recuperação Judicializada (PRJ), introduzido pela Portaria PGFN 721/2025. Como a metodologia é resguardada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e não é divulgada ao contribuinte, muitos negociadores sequer conhecem a fundo as bases que definem seus próprios descontos e condições. Segundo dados recentes, 72% dos contribuintes sentem-se em desvantagem nesse processo, enfraquecendo a confiança no instrumento e abrindo espaço para assimetrias nos acordos firmados.

Outro ponto sensível está nas restrições para utilização de créditos fiscais, como prejuízo fiscal, na amortização das dívidas. Esse impedimento reduz a atratividade da transação para parte relevante das empresas, especialmente aquelas que, em função de oscilações econômicas, acumulam créditos fiscais e buscam regularização. Soma-se a isso a vedação de descontos para débitos garantidos por depósitos judiciais, o que penaliza exatamente o contribuinte que adotou conduta mais conservadora e colaborativa (?!?!).

Por último, existe o risco do chamado “moral hazard”: estatísticas mostram que empresas com histórico de inadimplência ou de contestações múltiplas tendem a se beneficiar mais das condições excepcionais de transação, em detrimento das que sempre buscaram a adimplência espontânea. Isso pode gerar incentivos distorcidos, premiando maus pagadores e tornando o sistema menos justo, como ficou célebre nos programas Refis “da vida”. Houve, pelo menos, nove grandes programas federais de REFIS desde 2000 (alguns reeditados ou reabertos mais de uma vez). Tais parcelamentos se tornaram recorrentes, sendo praticamente anuais.

Reconhecer e debater esses calcanhares de Aquiles é fundamental para o aprimoramento da transação tributária. O avanço contínuo dependerá de mais transparência, revisão de vedações e adaptações que preservem a equidade e a efetividade do sistema, sem criar brechas que comprometam a justiça fiscal e a confiança dos contribuintes.