“Os brasileiros não economizam, são uns esbanjadores. Gastam tudo em impostos.” (adaptado de Chumi Chumez)
A decisão do CARF no ac.1202-001.586, de 25/04/2025, que considerou indedutíveis as despesas de inauguração de hipermercado pela construtora revela uma inconsistência interpretativa que merece reflexão. Ao qualificar tais despesas como “mera liberalidade”, o colegiado aplicou uma interpretação excessivamente restritiva do conceito de “necessidade”, que contrasta com a própria racionalidade do IRPJ/CSLL.
A interpretação da “necessidade” é o ponto fulcral e precisa ser compreendida em um sentido mais amplo do que apenas aquilo que é diretamente “exigido” por um contrato ou lei. Ora, basta dizer que a lei se refere à necessidade para a manutenção da respectiva fonte produtora. Esta fonte produtora não se limita à operação física. Ela abrange todo o complexo organizacional, incluindo seu capital humano, sua cultura e sua capacidade de adaptação e crescimento sustentável.
Se aplicarmos a mesma lógica utilizada para glosar as despesas de inauguração às despesas de confraternização – igualmente objeto de restrição no CARF -, estaremos perpetuando uma visão reducionista que desconsidera aspectos fundamentais da gestão empresarial moderna. Inaugurações e confraternizações não são eventos sociais desconectados da atividade empresarial. Ambos representam investimentos estratégicos em relacionamento institucional, posicionamento de marca e construção de reputação, elementos indissociáveis da manutenção e desenvolvimento da empresa.
A racionalidade econômica do capitalismo, por si só, impulsiona os empresários a investir em ações que sejam indispensáveis à manutenção e ao crescimento sustentável dessa fonte produtora. Se assim não fosse, convenhamos, por que o empresário abriria mão de parte de seus lucros em favor de gastos inócuos à produção de mais riqueza?
Assim, despesas com a promoção do bem-estar e do sentimento de pertencimento dos funcionários, como as de uma confraternização, transcendem a categoria de liberalidade destituída de propósito operacional. Elas são, na verdade, investimentos estratégicos na gestão do capital humano, um ativo intangível de valor incalculável e fundamental para a saúde da empresa.
Claro que estas despesas – como todas as outras – estão submetidas à razoabilidade e à proporcionalidade. Mas tal fato não autoriza o Fisco, nem o CARF, a agir como um administrador, ditado o que é bom ou ruim para o negócio. Somente o excesso notório do gasto submete-se à indedutibilidade.
A hermenêutica jurídica contemporânea reconhece que a aplicação das normas transcende a literalidade textual, exigindo interpretação sistemática e teleológica. Reduzir o conceito de “necessidade” à mera consulta lexicográfica empobrece a compreensão jurídica e desconsidera a evolução das relações empresariais.
