“A arte dos impostos consiste em depenar o ganso de tal forma que se obtenha a maior quantidade de penas com o mínimo de barulho.” (Jean Baptiste Colbert)
A controvérsia gerada por decisões como a do ac. 1202-001.586, de 25/04/2025, do CARF – que glosou despesas de inauguração por construtora de um hipermercado, supostamente incorridas por “mera liberalidade” em favor do dono da obra – ilustra a persistente tensão entre a autonomia da gestão empresarial e a interpretação fiscal sobre a dedutibilidade de gastos.
O ponto central da nossa crítica reside na adoção de critérios subjetivos por parte do Fisco, desconsiderando a lógica de mercado e a própria fundamentação legal que deveria reger a matéria.
A legislação tributária estabelece que despesas operacionais são aquelas “necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora”, devendo ser “usuais ou normais” para o tipo de transação e atividade empresarial.
No esforço para compreender a natureza e o alcance de uma despesa dedutível, é crucial entender que “necessária”, “usual” e “normal” são conceitos complementares, e não concomitantes ou simultâneos. A necessidade de uma despesa não se limita a uma obrigação legal ou contratual, mas se estende à sua pertinência e relevância para a exploração das atividades da empresa, sejam elas principais ou acessórias. A usualidade e a normalidade, por sua vez, atestam que o gasto se alinha às práticas comuns e habituais do setor ou tipo de transação.
A questão é que o Fisco – suportado por algumas decisões do CARF – ao invés de adotar essa interpretação sistemática e objetiva, frequentemente impõe um juízo de valor sobre a conveniência gerencial da despesa. Ao rotular gastos de inauguração como “mera liberalidade”, ignora-se o valor estratégico e comercial que a empresa autuada lhes atribuiu.
Para uma construtora, a inauguração de um hipermercado apresenta-se como uma ferramenta poderosa de marketing, de relacionamento com o cliente (dono da obra) e de fortalecimento da marca, elementos essenciais para a perpetuidade e o sucesso do negócio.
A fiscalização não deveria se imiscuir na liberdade do exercício da atividade empresarial, decidindo o que é “inadequado”, “caro demais” ou “desnecessário” sob a ótica de um administrador.
Aliás, a dedutibilidade sequer deve ser afastada se a respectiva despesa advém de ato ilícito. Vide o caso das multas, as quais devem ser consideradas dedutíveis, independentemente se (a) legais ou contratuais, (b) moratórias ou punitivas, (c) tributárias ou não.
Afinal, o conceito de despesa dedutível não possui um conteúdo semântico preciso, fixo e exaustivo. Decorre de uma cláusula aberta ou conceito jurídico indeterminado, que só pode ser limitado por lei, como o vez o art. 13 da Lei 9.249/95 em determinados casos.
