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De boas intenções e alíquotas, o inferno fiscal está cheio.

Em 19/10/2024, o Plenário do STF considerou inconstitucional (Tema 1.174) a cobrança de 25% de IRRF sobre aposentadorias e pensões pagas a residentes domiciliados no exterior (leia-se, brasileiros que foram morar fora do país). Em seu lugar, deverá incidir as alíquotas da tabela progressiva (zero a 27,5%), tal como aplicada aos residentes no Brasil.

Haveria suposta violação aos princípios da isonomia entre residentes e não residentes, da progressividade, da vedação do confisco e da proporcionalidade. Mas a decisão levanta questionamentos importantes sobre o funcionamento do direito tributário internacional.

Primeiramente, a competência para a incidência do imposto de renda não se baseia apenas na existência de acréscimo patrimonial, mas também na presença de uma fonte produtora de rendimento no país. Isso é particularmente relevante no caso de rendimentos de não residentes gerados no Brasil. A decisão parece não ter dado o devido peso a este preceito, que justifica tratamentos tributários distintos entre residentes e não residentes.

Além disso, a substituição da alíquota fixa pela tabela progressiva não necessariamente garante um tratamento isonômico, como sugerido pela decisão. Os não residentes estão sujeitos à legislação tributária de seus países de residência, onde podem enfrentar nova tributação sobre os mesmos rendimentos. A aplicação da tabela progressiva brasileira, sem considerar a situação fiscal global do contribuinte no exterior, pode não favorecer o beneficiário ou mesmo resultar em distorções.

Outro ponto que parece ter sido negligenciado é o fato de que o IRRF pago no Brasil geralmente ser tratado como mero crédito tributário (“tax credit”) no país do não residente brasileiro. Ao reduzir a tributação na fonte, o STF pode inadvertidamente estar transferindo receita tributária do Brasil para jurisdições estrangeiras, sem necessariamente beneficiar o contribuinte, que pode acabar pagando a diferença em seu país de residência.

Por fim, a decisão do STF suscita dúvidas sobre a extensão de sua aplicabilidade. Não está claro se o fundamento de inconstitucionalidade ficará restrito ao caso julgado ou se poderá afetar outras situações de tributação de não residentes. Caso se estenda a outros cenários, qual será o critério? Esta incerteza pode levar a uma série de questionamentos judiciais, como ocorreu na situação envolvendo a tributação dos juros sobre salários pagos em atraso, considerada judicialmente indevida, mas cujos fundamentos não foram repercutidos em casos tidos como análogos. Muito insegurança.

Vamos aguardar a íntegra do acórdão. Embora motivada por preocupações com a isonomia e a capacidade contributiva, a decisão do STF parece não ter considerado adequadamente as complexidades do direito tributário internacional e as consequências práticas para o sistema fiscal brasileiro. Espero que estejamos realmente promovendo avanços civilizatórios e protegendo direitos fundamentais.