No acórdão 9101-007.023, de 06/06/2024, a Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), órgão de cúpula do CARF, abordou os reflexos tributários decorrentes de pagamentos que não foram contabilizados pela empresa. E que reflexos, viu? Uma verdadeira bola de neve.
Explico. A partir da identificação de UMA irregularidade (remessas ao exterior não contabilizadas), a fiscalização firmou DUAS exigências fiscais distintas:
– a primeira, relacionada à cobrança de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) para os casos de beneficiário não identificado ou pagamento sem causa, à alíquota de 35% (alíquota efetiva de 53,84% – se não sabe o porquê, me pergunta);
– a segunda, oriunda da presunção legal de omissão de receita, em virtude da falta de escrituração de pagamentos efetuados (art. 40, Lei 9.430/96), repercutindo na cobrança de IRPJ/CSLL e PIS/Cofins na sistemática do Lucro Presumido que era adotada pela empresa.
Tudo isso acompanhado de uma multa qualificada de 150%, aplicada nos casos de dolo, fraude ou simulação.
Pois bem. A CSRF manteve as exigências fiscais principais sobre as remessas ao exterior não contabilizadas. Esta determinação baseia-se no preceito de que todo pagamento deve ser devidamente registrado e tributado, independentemente de sua natureza ou finalidade. A falta de contabilização dessas remessas levantou suspeitas sobre possíveis tentativas de evasão fiscal, justificando a cobrança do 35% IRRF.
Ademais, não há “bis in idem” ou bitributação na cobrança de IRPJ/CSLL e PIS/Cofins, pois se trata de fatos geradores distintos. A presunção de omissão de receitas tem em conta recursos mantidos à margem da contabilidade, evidenciando materialidade distinta da tributada pelo IRRF.
Além do IRRF, o acórdão também confirmou a exigência de IRPJ/CSLL e PIS/Cofins com base na presunção de omissão de receita. Esta presunção decorreu da falta de escrituração dos pagamentos efetuados, conforme previsto no artigo 281, inciso II do Regulamento do Imposto de Renda (RIR/99). No caso em questão, a empresa estava sujeita ao regime de lucro presumido, o que influenciou diretamente na forma de cálculo dessas obrigações tributárias.
Por fim, cabe dizer que decisão da câmara baixa já havia afastado a qualificação da multa, a qual passou de 150% para 75% sobre o valor dos tributos devidos. O CARF entendeu que, embora houvesse irregularidades na contabilização e nas remessas, não ficou caracterizada a intenção deliberada de fraude por parte da empresa, justificando assim a redução da penalidade.
Este caso ressalta a importância da correta contabilização e declaração de todas as operações financeiras, especialmente aquelas envolvendo remessas internacionais. Ele serve como um alerta para empresas sobre as potenciais consequências fiscais de não manter registros adequados e transparentes de suas transações financeiras, mesmo quando não há intenção deliberada de sonegação fiscal.
Obs.:
– nas hipóteses de beneficiário não identificado ou pagamento sem causa, além do 35% IRRF, a correspondente despesa é considerada indedutível, o que impacta a apuração no Lucro Real.
– sobre o 35% IRRF, sugiro ler os recentes artigos de Carlos Augusto Daniel Neto no site do Conjur.